quarta-feira, 24 de junho de 2009

T(r)ópico #17 - Barra do Kwanza.. o Paraíso na Terra!!!!

22.02.2009


Tinha chegado a Luanda na sexta-feira, dia 20, e dois dias depois, já estava provar o sabor desta terra.. a sentir a natureza, a sua beleza natural, o seu gosto... a sua tranquilidade...

No dia anterior, paramos na berma da estrada para escolher o equipamento.. uns angolanos, a caminho de onde passaríamos no dia seguinte, vendiam junto à estrada, todo o equipamento de praia, meio sujo, empoeirado e, digo eu, usado. Mas aqui, é como se fosse tudo novo. Compramos uns toldos, umas mesas de plástico, cadeiras, cadeiras baloiço, espreguiçadeiras, e até uma mesa tipo de campismo "Camping Gas" para os miúdos se sentarem, e já agora, e porque não.. umas canas de pesca e uma bicicleta.

"Junta tudo isso aí, que amanhã o motorista passa por aqui e leva, o resto que vocês ainda têm de ir buscar. E não se esqueçam!!! Hã!? Toma lá mais 100 USD, para teres a certeza que não te vais esquecer, ya!?" disse, quem comanda, enquanto eu, ajudando como podia aqui e ali na escolha dos equipamentos, tentando que ele formasse o conjunto mais harmónico possível e mais cromaticamente equilibrado, e observava, impávido, o desenrolar das notas de 100 USD que ele trazia no bolso, e que uma atrás da outra, foram passando para as mãos dos "vendedores". Não contabilizei, mas na certa, aquela compra de "em cima do joelho", tinha rendido uma safra, assim por alto de mais de 1800 USD, (+-1325€), algo que em Portugal, facilmente se compraria por uns 600€ em qualquer supermercado, e ainda com os plásticos a garantir que seriamos nós a estrear o equipamento! Já para não falar, do leque de modelos e cores disponíveis! Aqui... compra-se o que se tem,quando tem, e custa os olhos da cara...

No domingo dia 22, arrancamos então daqui, passavam já das 10 e meia. A viagem, rumo ao sul é tranquila com a praia e a enorme ilha do Mussulo a acompanhar-nos todo o trajecto de 1 hora e pouco de viagem, sempre pela direita, até à Barra... onde o rio Kwanza se encontra com o mar.


O terreno onde vamos acabou de ser adquirido, e vamos reconhece-lo...
É uma faixa de terreno virgem, com uns 150m de largura e 300 de comprimento que, numa área plana e polvilhada por lindos conjuntos de palmeiras, se estende desde o interior e termina justamente em frente à foz, onde o rio se cruza com o mar, o oceano!


Junto ao areal da praia, uma vegetação rasteira prova ainda a virgindade do local, e do lado de lá do areal e da língua de rio há ainda um areal onde pescadores, levam o seu Land Rover original e pescam peixes variados e gigantes!


Chegamos passava pouco do meio dia. O sol é quente e, com o céu despido de nuvens, queima na pele. A sombra das palmeiras é providencial!

Os peões, já tinham montado o equipamento, que resolvi relocalizar para melhor dele tirar partido. O motorista, que tinha vindo mais cedo, tinha também passado pelo supermercado e comprado o nosso almoço.


Digo almoço, no fundo, para ser modesto. Em 4 ou 5 grandes arcas de conservação, tipo "Camping Gas", havia bebidas (cerveja sumos guaraná, águas e outras mais a perder a conta, mergulhadas em quilos de gelo. Estas ocupavam 2 arcas. As restantes tinham a (muita e variada) carne, e o peixe que era local, tinha acabado de ser comprado a um pescador lodo pela manhã.

Enquanto damos uma volta pela frente do terreno e vou molhar os pés na água tépida, as mulheres com as raparigas contratadas para o efeito, preparavam as brasas, a carne, o peixe, cortavam o pão e faziam as saladas, sem nunca se esquecerem de preparar muito bem o jindungo!


Junto à àgua, as crianças brincavam como podiam, e iam comprovando a suspeita de que a água estaria deliciosa. Sento-me na areia junto à água e fico a observar a tranquilidade... as àguas calmas, os peixes que, em pequenos saltos vinha-me dizer que ali também havida vida, e que pelo menos, naquelas águas próximas do derradeiro encontro com o oceano, estariam mais a seguro dos jacarés que, um pouco mais acima, nos juncos sobreiros nas margens preparam as suas mortais emboscadas. Do outro lado, a linha de areia vem acentuar a linha do horizonte...


Os tenis saltaram fora e tomaram lugar as havaianas, os calções pelos calções de banho, a areia escaldante e a água quente solicitavam um contacto mais próximo.



O alarme sou! Um peão veio trazer a mensagem... o almoço estava pronto! O cheiro a carne grelhada, e a peixe na brasa à medida que nos íamos aproximando da sombra das palmeiras aguçavam o apetite e na pequena elevação de areia, apoiada pelo equipamento recentemente adquirido, e um som de bossanova que vinha do Patrol, criava-se o ambiente perfeito para uma tarde de degustação e tranquilidade que ainda só agora começava...

O almoço começou com uma, duas, três,tantas estórias, uma após a outra, regadas pela cerveja que pontualmente se pescava da arca, onde mergulhadas no gelo já meio derretido, vinham acompanhar e alegrar um pouco mais aquela tarde de troca de experiências, de rumos, de objectivos, de sonhos e de ilusões, sempre acompanhados por um peixe grelhado que não parava de chegar à mesa, e que quando, guiado pelo metal do garfo, me chegava à boca, à lingua, parecia desfazer-se... o sabor era potenciado não só pelas brasas, que com calor iam tostando cada face daquele delicioso peixe, mas acima de tudo por todo aquele enquadramento natural fantástico, em que as horas pareciam arrastar-se vagarosamente, ao sabor da corrente do Kwanza que logo ali ao lado, tranquilamente se ia encontrar com o seu destino... com o Oceano... o oceano que liga os mesmos países que uma mesma lingua ainda une, um trio que outrora fora um Só, e que agora se prometem reencontrar em Angola, Brasil e Portugal, para um mesmo fim, no mesmo país...

Mas agora, são mesmo só 2 portugueses que, deliciosamente degustam todo aquele cenário natural, na companhia de uma simpática e acolhedora família angolana, os trabalhadores e motorista, as crianças, o som do rio, o som do mar, a leve brisa nas palmas, o sol por entre os dedos do pintor... aposto que, se Renoir, Monet ou Degas se tivessem podido encontrar com Gauguin, naquela tarde, naquele mesmo sítio naquele domingo, teríamos ficado representados ali.. entre a natureza e a tela, numa impressão impressionista de pós-impressionismo colorido, pelo verde e azul da água, os verdes amarelados das palmeiras, o amarelo da areia, o laranja do por do sol, o abraço do tom pálido dos portugueses, com o negro dos angolanos, o peixe tostado... a carne vermelha... o sal ainda no corpo, tudo isso e a cor do momento que espelhava a felicidade.. esse doce momento que volta e meia, a vida nos presenteia, e só um artista, um impressionista conseguiria tão bem captar para a posteridade, na táctil forma de captar com movimentos rápidos, em precisas pinceladas o brilho, o efeito das luzes... e onde as cores de áfrica se perpetuariam, intensas, como nas tardes vivas gravadas nos quadros de Paul Gauguin...

A tarde parecia não passar, e porque já sabia bem apanhar um ar fresco, então chamou-se o outro empregado que tinha ficado de contratar um barco... "Cumé..., já chamaste o barco?"

A refeição pediu a calma, e o tempo deu-lha... agora eram as águas que nos chamavam em suaves sussuros, tocando ao de leve com pequenas ondas tímidas, a areia quente da praia... deslocamo-nos até lá! O barco estava a chegar...

Ao chegarmos à linha de água, torneando por entre os juncos secos estendidos no areal, avistamos o barco que, de motor já desligado (parecia não querer interromper aquele momento de paz interior com o seu ruído característico), se aproximava embalado pela leve ondulação ,na berma. O barco não era grande, mas coubemos todos e, mais pequeno fosse, mais empolgante seria a viagem.


Arrancamos em direcção ao Sul, para logo entrarmos rio a dentro a Este. A paisagem inspira...


O rio é grande, largo, com vegetação de um lado e do outro, verde, viva, a tocar a água, a embrulhar-se nela, e a ocultar vidas... outras vidas, de outra natureza, umas mais pequenas e esguias como os os peixes e libélulas, outras maiores, que no silêncio da emboscada, procuram as suas presas para devorarem com as suas poderosas mandíbulas.













O passeio deve ter durado uns deliciosos 30 a 40 minutos... entramos pelo Kwanza a dentro, passamos a ponte, avistamos um afluente, viramos nos juncos, saboreamos a brisa, provámos a água, brincámos com o combustível que tinha acabado, contamos anedotas, bebemos a paisagem e voltámos à margem...

A tarde foi-se passando por entre os risos das crianças, a sombra dos chapéus (agora colocados à beira da água), e o suave esticão da corda de nylon que denuncia a mordida de um peixe no anzol, este mais esperto que nós pois levou o isco e deixou o anzol bailar ao sabor da corrente! Isto, claro, na única cana que montei, pois as restantes saíram da embalagem, mas quando dei conta já a linha se tinha envolvido em torno do carreto e os miúdos reclamavam que aquilo não estava a funcionar...

A tarde foi passando e com ela um degradê celeste, de tons azuis para os tons laranja...

Ao fim da tarde, a mesa, montou-se agora distante da sombra, pois a temperatura já permitia desfrutar aquela deliciosa paisagem, pintada agora em tons quentes, e o grelhador voltou de novo a funcionar, compondo aquele quadro com um cheiro a grelhados... desta vez, de carne!

A refeição fez-se uma vez mais, vagarosamente, por entre novas estórias e anedotas, imaginou-se o futuro do local, projectaram-se novos e vindouros momentos como este, e regou-se tudo com bebidas frescas, pois apesar de o dia estar a caminhar para a Hora de Ouro, o calor ainda se fazia sentir... e a brisa.. essa, tinha ido dar um mergulho, e deixou-nos a desfrutar a companhia do sol, que agora, descendo em direcção a outras latitudes, pintava o céu de tons deliciosamente quentes, e presenteava-nos com um espectáculo como que se nos convidasse para voltarmos... e voltarmos logo...


No meio da natureza, quando o sol se põe, resta ainda uma claridade ténue, que se vai desvanecendo com o passar dos minutos...

Novos sons surgem para substituir os diurnos, e a brisa volta de novo, para nos lembrar que está na hora de voltarmos... ...voltarmos à realidade e ao caos da capital Angolana!


O meu grande desafio para este local, vai ser, respondendo aos requisitos programáticos e exigentes do cliente, conseguir implantar uma pequena área privada em convivência com um, também pequeno resort, sem ferir a beleza e tranquilidade deste pequeno pedaço de paraíso, à beira rio/mar perdido...

(Foto aérea da Barra do Kwanza, tirada no jacto particular quando a sobrevoamos, de regresso do Lubango - 08.03.2009)

À vinda, o inevitável transito que, à medida que nos aproximamos de Luanda se vai adensando ao ponto de parar. Pessoas saem dos carros, encetam danças (kizomba, kuduro) cantam, e um par de miúdos brincam a queimar o tempo. O regresso demora mais cerca de 2 horas do que a ida... mas isso não é motivo para desânimo... não, pelo contrário.. num outro país, seria um desespero.. aqui... é somente mais um motivo para nos divertirmos, para o convívio, para explorar o nosso bom humor, e rirmo-nos com a forma perigosa e confusa da condução que por aqui se faz, ou do estado de um ou outro carro que passa por nós ou nós passamos por ele... como do Toyota Rav4 que ultrapassamos umas 2 ou 3 vezes, e que, incrivelmente se deslocava somente com 3 rodas, sendo a quarta só a jante com um pedaço de pneu ainda agarrado, e que viajava como se não fosse nada com ele... o importante era continuar a andar e chegar ao destino, desviando-se dos postes de electricidade quase tombados na via, e quando esta já não andasse, não havia problema.. ele descia para a vala, e contornava pela direita os carros que não eram tão espertos quanto ele, e ficavam ali, certinhos, na estrada de asfalto esburacado, quando se descessem um pouco, ultrapassavam mais uns quantos! Tudo isto, todo este quadro vem encher de cor o meu segundo dia, que já vinha cheio com a memória do pôr do sol dourado, naquele pedaço de paraíso à beira mar...